Urubu Cultural

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segunda-feira, 7 de setembro de 2009

A Zundapp da Morte

  A Morte tinha uma motorizada e, ao depósito de combustível, soldou uma metralhadora. Permitia-lhe esta engenhosa invenção, conduzir, e disparar ao mesmo tempo.
Certo dia, a Morte decidiu ir matar Carmendim, que era um rapaz muito pobre, que vivia no campo com os pais, numa singela casa de taipa. Lá chegada, a Morte foi bater à porta da família Santos, rogando deste modo:
- Entreguem o vosso filho.
O senhor Santos, que necessitava do seu primogénito para o auxiliar na lavoira, desde logo se opôs:
- Vai-te embora Morte! – e com isto, pegou numa pedra, e acertou no bigode da Morte.
Envaidecida, a Morte ligou a motorizada, começando a circular em torno da casa, ao mesmo tempo que abria fogo sobre a mesma.
 No interior do casebre, Carmendim refugiara-se no quarto dos pais, com a mãe, debaixo do leito de ferro. Na casa de jantar, o pai, ajoelhado, rezava, pedindo a nosso senhor que levasse a Morte embora (nosso senhor, no céu, fartava-se de rir com isto tudo, era como ir ao circo Chen).
 Neste entretanto, a Morte não parava de circundar a pequena habitação, ao mesmo tempo que, como já se disse, fazia fogo cerrado com a metralhadora. O senhor Santos já estava a ver a coisa preta, quando a ajuda surgiu de onde menos se esperava, isto é, de Satã, ele mesmo, o principal das Trevas.
 No quarto, Carmendim chorava muito, agarrado à mãe.
 Satã sugeriu ao senhor Santos o seguinte: ele que fosse vomitar na rua, com o fim da Morte escorregar, e se despistar com a motorizada. Ele assim fez, quando se apercebeu de que a Morte estava nas traseiras da sua casa, saiu, e forçou o vómito.
 A Morte, que andava a toda a brida, invariavelmente, ao passar por cima do vómito, caiu com a motorizada, não sem antes ainda conseguir atingir o senhor Santos, com uma bala de metralhadora, na veia jugular. Teve Morte instantânea.
 Não satisfeita, a Morte pegou outra vez na mota, continuando a dança fatal, em torno da casa de Carmendim Santos. Mesmo depois do cair da noite, acendeu o farolim da motorizada, que funcionava perfeitamente, e não foi isso, que a impediu de continuar a metralhar a casa. As grossas paredes de terra, pareciam já um passador. Eis então que surge o Sandro Costa, de cadeira-de-rodas, e diz à Morte:
- Morte, pára!
E a Morte parou.
 Sandro Costa era um anjo muito importante no céu, e graças à sua cadeira de rodas mágica, conseguia fazer milagres, levando a bondade até ao coração mais empedernido.
A Morte, não querendo admitir a derrota, proferiu:
- Acabou-se-me a gasolina, foi por isso que parei, oh bem-aventurado!
 Ao anjo Sandro Costa, nasceram-lhe asas e voou até Espanha, onde foi comprar deliciosos caramelos de pinhão, que trouxe para Carmendim, aterrorizado, degustar. Carmendim comeu dez de seguida, obviamente, ficando com uma caganeira do caraças e, como tinha medo de ir à rua, teve que obrar a um canto da casa. O cocó do Carmendim, era o pitéu predilecto do anjo Sandro Costa, que a devorou sem hesitar um instante. A mãe de Carmendim, que estava desmaiada debaixo da cama, acordou, e foi à sala de jantar, onde viu umas grandes asas brancas, ao canto da casa. Pegou numa faca, e matou o anjo Sandro Costa, por pensar que este se tratava de uma ave de capoeira, ou coisa que o valesse. Sangrou o anjo para dentro de um alguidar de barro, com vinagre, a fim de preparar uma deliciosa cabidela.

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