Urubu Cultural

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sábado, 1 de agosto de 2009

Amizade

 Monsenhor Nikodim oscila na sua velha poltrona, de veludo carmesim, decide questionar Omar:
- Se eu lhe pedisse, abraçar-me-ia?
- Com certeza que não.
- Porquê, posso saber?
- Por um acaso, não se apercebeu que essa inconsciente acção, nos granjearia uma… como direi? reputação homossexual, com a qual eu, Omar Santos, não gostaria de ser conotado.
- Oh meu caro, de forma alguma, eu sou o alto bastonário para o: Fim do Preconceito Sexual. Não tema!
E então, Omar tomou nos braços Monsenhor Nikodim, abraçando-se ambos, comovedoramente, como irmãos:
- Oh Omar…, agora que nos abraçamos, e se nos tornássemos irmãos de sangue, hein?
- Concordo, mas o bidé, que é uma palavra muito raramente escrita, está entupido…
- Não me diga, camarada!?
- Vou buscar uma navalha bem afiada, ao faqueiro que jaz no aparador.
E assim sucedeu, Omar foi, e Omar voltou, com o facão de trinchar carnes:
- Dê cá a sua mão, Nikodim. – golpeou-a.
- Doeu?
- De forma alguma. Mas apresse-se, antes que as varejeiras venham depositar aqui larvas, é urgente que se corte também, imperativo! Compreende a situação?
E assim, Omar cortou a palma da sua mão, seguindo-se um passou-bem fraternal.
Enquanto se preparavam para dormir, Omar no beliche cimeiro, Monsenhor Nikodim no de baixo, o segundo recordou-se:
- Tem consciência, do meu passado de furiosa toxicodependência, Omar?
- Tenho pois.
- Saiba também pois, que nesses terríveis anos da minha vida, contraí a síndrome de imunodeficiência adquirida.
- Lamento, o que posso fazer por si?
- Nada, só que, como partilhámos o mesmo sangue, aquando da união fraternal, acho que você também contraiu o maldito vírus.
- Vou morrer?
- Morrerá.
- Tal como você?
- Exactamente.
- E se nos suicidássemos?
- Excelente ideia.
E Omar foi buscar os comprimidos de cianeto, que se guardam sempre para estas ocasiões:
- Como os tomaremos?
- Com um cálice de vinho do Porto – Monsenhor Nikodim foi buscar a garrafa.
Trouxe também dois cálices, que encheu de néctar, fez sinal de estar pronto a Omar, e este distribuiu os comprimidos; gritaram: «À nossa», engolindo os primeiros com o vinho do Porto, faleceram momentos depois.

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